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Contrato de seguro de transporte: A falha no gerenciamento do risco e a responsabilidade da seguradora

Contrato de seguro de transporte: A falha no gerenciamento do risco e a responsabilidade da seguradora

O contrato de seguro de transportes, facultativo de responsabilidade civil do transportador rodoviário por desaparecimento de carga (RCF-DC), garante, até um limite máximo de indenização definido na apólice, a responsabilidade do transportador por perdas na carga em razão do roubo ou desaparecimento do veiculo e carga, em decorrência de riscos predeterminados, tais como furto simples ou qualificado, roubo, extorsão simples mediante seqüestro, apropriação indébita e estelionato, roubo em depósito de propriedade de transportador, entre outros a critério da seguradora.
Estabelece, salvo raras exceções, que a cobertura do risco estende-se há quaisquer localidades do território nacional, inclusive perímetro urbano e suburbano.
E prevê que o pagamento integral da indenização está condicionado à obrigação do segurado adotar medidas de gerenciamento de risco, executadas por empresas devidamente especializadas, com atuação reconhecida e dentro dos padrões exigidos pela apólice de seguros.
Desta forma, e de modo geral, o contrato estabelece que o inadimplemento de qualquer dever predeterminado ao segurado restringe a garantia oferecida. Todavia, por outro lado, tendo o segurado adimplido todas as obrigações impostas pela seguradora não há fundamento fático ou legal que a exonere da obrigação regularmente assumida no contrato de seguro.
Assim, promovido o gerenciamento do risco, eventuais falhas, especialmente de terceiros, não podem ser considerada, automaticamente, como uma excludente de responsabilidade contratual pela seguradora.
Observadas as exigências previstas no contrato de seguro e não havendo, por parte do segurado, ato que agrave o risco, não pode a seguradora eximir-se da obrigação contratual, como reconhece a jurisprudência: “(…) 1. O objeto principal do seguro é a cobertura do risco contratado, ou seja, o evento futuro e incerto que poderá gerar o dever de indenizar por parte do segurador. Outro elemento essencial desta espécie contratual é a boa-fé, caracterizada pela sinceridade e lealdade nas informações prestadas pelo segurado ao garantidor do risco pactuado, cuja contraprestação daquele é o pagamento do seguro. 2. Desse modo, o segurador só poderá se exonerar de sua obrigação se ficar comprovado o dolo ou a má-fé do segurado, ou se houver agravamento do risco, ante o desequilíbrio da relação contratual, tendo em vista que aquele receberá um prêmio inferior ao risco garantido, em desconformidade com o avençado. 3. No caso em exame, a segurada realizou pesquisa de cadastro do motorista em empresa autorizada pela seguradora em data anterior a ocorrência do sinistro. Renovação da documentação que deveria ocorrer a cada seis meses. 4. Ausência de prova no sentido de que a autora tenha agido de má-fé, o que afastaria o dever de indenizar, ônus que se impunha a demandada e do qual não se desincumbiu, a teor do que estabelece o art. 333, inciso II, do Código de Processo Civil. (…)” (Apelação Cível Nº 70031901606, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 16/12/2009)
Para MM. Des. Domingos Coelho, integrante do E. Tribunal de Minas Gerais, não é razoável responsabilizar o segurado pela falha do serviço de monitoramento por empresa gerenciadora do risco ou por ato do motorista realizado sem permissão, restringindo-lhe o direito à indenização prevista no contrato de seguro: “(…) Ora, no caso dos autos, em momento algum se falou em dolo ou má-fé da autora aptos a favorecer o sinistro. Na própria investigação realizada unilateralmente pela requerida, aliás, ficou claro que o roubo se deu sem qualquer participação ou contribuição da autora ou de seu preposto – motorista do veículo. Em circunstâncias tais, a mera ausência de calibragem do equipamento de monitoramento via satélite, ainda que pudesse caracterizar culpa da autora – a prova, em alguns aspectos, é contraditória a tal respeito -, como compreendido pela sentença primeva, não é suficiente para afastar a cobertura securitária, uma vez ausente o elemento volitivo. Em outros termos, se não há má-fé ou dolo configurados, não se pode falar em agravamento intencional do risco objeto do contrato, como exige o artigo 768 do CC como conditio sine qua non para a perda da garantia. E nem se diga que houve o mero descumprimento de cláusula contratual, tema este já enfrentado alhures, mas que também deve ser abordado sob o seguinte enfoque: a exigência de utilização de veículo equipado com sistema de rastreamento e monitoramento por satélite com bloqueio dos caminhões foi devidamente atendida pela autora, que inclusive contratou uma empresa aprovada pela requerida. A autora pagou pelo serviço de rastreamento e confiava que ele estivesse funcionando, sendo sua boa-fé presumida. A mera falha na prestação do serviço correlato ao transporte, quando o equipamento foi devidamente instalado, por orientação da seguradora, não pode servir de escusa para o dever de indenizar securitariamente. (…)” (TJMG – APC 1.0702.06.318501-2/001 (1) – Del Rel. Domingos Coelho – Julgado 27/04/2011)
Com efeito, como perfeitamente esclarece Cavalieri Filho, somente o fato exclusivo do segurado pode ser invocado como excludente de responsabilidade do segurador, mesmo assim quando se tratar de dolo ou má-fé. Para alguns, a culpa grave do segurado também excluiria a responsabilidade do segurador, mas, em nosso entender, se razão. A culpa, qualquer que seja a sua gravidade, caracteriza-se pela involuntariedade, incerteza, produzindo sempre resultado não desejado. Ademais, é um dos principais riscos cobertos pela apólice. Quem faz seguro, normalmente, quer também se prevenir contra os seus próprios descuidos eventuais. E, ao dar cobertura à culpa do segurado, não seria possível introduzir distinção entre os diversos graus ou modalidades de culpa. Além da dificuldade para se avaliar a gravidade da culpa, a limitação acabaria excluindo a maior parte dos riscos que o segurado deseja ver cobertos, tornando o seguro desinteressante. Entendo, assim, que a culpa do segurado, qualquer que seja o seu grau, não exonerando de responsabilidade o segurador. (…) O agravamento do risco, dependendo de sua intensidade, pode afetar de tal forma o equilíbrio do contrato a ponto de romper a sua estabilidade econômico-financeira. O segurador passa, então, a receber um prêmio insuficiente para o cumprimento de suas obrigações contratuais. (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 4. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003)
Nas situações em que todas as obrigações impostas no contrato foram regulamente atendidas, a restrição de direitos (relacionadas a falha no plano de gerenciamento do risco, especialmente por ato de terceiros) imposta pela seguradora, mostra-se demasiadamente exagerada, desvirtua a própria essência do contrato de seguro e prestigia o enriquecimento indevido da seguradora, como reconhece a jurisprudência: “(…) Todavia, referida cláusula onera o contratante do seguro, que além de arcar com o preço do seguro, obriga-se a investir em itens de segurança e a contratar empresa especializada em escolta para assegurar que nenhum dano venha a ocorrer ao bem segurado. Nessa mesma ótica, verifica-se que mencionada cláusula transfere à segurada toda a álea do seguro, causando desequilíbrio entre os contratantes ao estabelecer desvantagem exagerada em favor do consumidor, nos termos do Código de Defesa do Consumidor. Dessa forma, a cláusula contratual, que imputa à transportadora a contratação de escolta armada e rastreamento da carga por satélite, assim como consulta de motoristas reveste-se de abusividade, porque promove a desigualdade entre os contratantes, haja vista que atribui ao segurado extrema onerosidade, em detrimento da empresa seguradora, a qual a fim de submeter seu seguro, exige indevidamente que a segurada arque todas as providências imagináveis pa-ra evitar-se o sinistro, afastando qualquer possibilidade do risco assumido em contratos desta natureza. Frise-se que os contratos de seguro inserem-se na categoria de adesão, razão pela qual são nulas de pleno direito as cláusulas que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada.: “Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (…); IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; V a XVI – omissis; § 1º. Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: I – (…) II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou o equilíbrio contratual;” (…) (TJPR – AC – 1100304-6 – Rel.: José Sebastião Fagundes Cunha – J. 13.03.2014) (grifo para ilustração)
Conclui-se, deste modo, que não é qualquer falha no processo de gerenciamento do risco que retira do segurado o direito à garantia contratada.

Abril/2016
Liliana Orth Diehl
Advogada – Especialista em Direito Securitário

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